sexta-feira, 22 de junho de 2012

Detectando Mentiras pelo Discurso

O discurso é o elemento de expressão que o mentiroso mais volta a sua atenção. O mentiroso tende a monitorar mais suas palavras do que em seus gestos corporais, por exemplo. A vantagem se voltar o discurso como alvo central do disfarce é a facilidade que se tem de ensaiar previamente o que será dito. Um vigarista pode formular e decorar anteriormente uma história para contar quando for dar o golpe em alguém, mas dificilmente ele terá essa possibilidade quando se trata de ensaiar expressões faciais nos momentos exatos. 


Apesar da facilidade de se enganar alguém pelo discurso, surpreendentemente, muitos mentirosos são traídos pelo o que dizem por causa do descuido. Vestígios de mentira podem ser indicados ou vazados em três fatores da unidade do discurso. São eles: as linhas de pensamento, as palavras e o tom de voz.

Linhas de pensamento



Mentirosos nem sempre antecipam quando eles terão que mentir. Nem sempre há tempo para preparar a história a ser seguida, para ensaiá-la e memorizá-la. Mesmo quando há um amplo aviso prévio, e uma falsa história foi cuidadosamente ensaiada, o mentiroso pode não ser astuto o suficiente para antecipar todas as questões que podem ser feitas. São sinais de histórias ensaiadas:
  • Pausas incomuns. O discurso apresenta várias pausas incomuns ao discurso usual do suspeito.
  • Lentificação  do que é dito. O discurso é lento - há um evidente sinal de que a pessoa está ponderando com muito cuidado cada palavra a ser dita.
  • Pensamento prolixo em determinados temas. Dar reviravoltas sobre o tema, sem chegar numa conclusão final coerente.
  • Repetição peculiar do que é dito. Repetição de frases inteiras, como se fossem ecos totais do que foi dito anteriormente.
  • Erros de fala, como:
    • Pseudopalavras, tais como: “ah...”, “ham...”, “hum...”
    • Repetições de palavras, como: “Eu, eu, eu quero, eu realmente quero...”;
    • Palavras partidas, como: “Eu realmente go-gosto disso.”

Vejamos a entrevista de Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá sobre o assassinato da menina Isabela Nardoni, filha de Alexandre e enteada de Ana Carolina. No trecho abaixo, Alexandre alega ter feito uma promessa sobre o caixão de sua filha de encontrar o a pessoa que a havia assassinado. Entretanto, esse simples enunciado - "Eu fiz uma promessa sobre o caixão da minha filha de que iria encontrar a pessoa que fez isso com ela" - é dito com extrema dificuldade por ele, apresentando erros no discurso como pausas incomuns, lentificação do discurso, pseudopalavras, reviravoltas sobre o tema e até mesmo repetição exata das mesmas frases de forma totalmente incomum.



Devemos ser cautelosos para evitar o risco de Brokaw. O risco de Brokaw consiste em considerar certos comportamentos usuais do indivíduo como indícios de fraude. Algumas pessoas são sempre prolixas, ecoam o que dizem, dizem pseudopalavras constantemente, etc. Ao longo da entrevista, nota-se que Alexandre Nardoni não possui um discurso muito bem articulado, cometendo alguns erros de fluência - e até gramaticais. Contudo, nota-se que sua dificuldade verbal piora muito quando ele trata do tema dessa promessa.

No segundo trecho do vídeo, ele conta algumas vivências que teve com a filha, memórias realmente genuínas, e por conta disso ele consegue articular bem seu discurso. Na terceira parte ele volta a comentar da promessa de encontrar o assassino de sua filha e novamente seu discurso piora consideravelmente. Curiosamento, sua fala volta a se articular bem quando ele comenta de uma segunda promessa - a de tatuar o rosto de sua filha. Analisando as duas promessas, chegamos a conclusão de que independentemente de ele ser ou não o assassino de sua filha, Alexandre pode acabar tatuando o rosto de sua filha, especialmente para reforçar a sua aparência de inocente. Todavia, é totalmente improvável que ele tenha prometido sobre o caixão de sua filha que ele iria encontrar a pessoa que a matou caso tenha sido ele o próprio assassino. Provavelmente devido a isso, ele forneceu tantos indícios de fraude quando alegou ter feito a promessa de justiça e revindicação.


Outras fontes de vestígios de mentira na linha de pensamento são:
  • Linhas de pensamento muito polidas. Histórias contadas sem nenhum erro ou equívoco podem ser sinais de elaboração ensaiada pelo suspeito. Acontecimentos que aconteceram verdadeiramente são geralmente lembrados com alguns erros por conta da falha da memória da pessoa que evoca tais lembranças. Já mentirosos muito bem ensaiados costumam contar histórias com uma elaboração muito linear, polida, indicando assim uma ensaio prévio do que foi dito.
  • Hesitar no começo da fala. Particularmente se a hesitação ocorre quando alguém está respondendo a uma pergunta, pode gerar suspeita.
  • Repetição de frases prontas. Quando o suspeito se prende a repetir constantemente frases pré-formuladas é sinal claro de que seu discurso é decorado.

No próximo exemplo, novamente iremos tratar da entrevista com o casal Nardoni. Repare que em boa parte do discurso, eles se prendem a repetir que são muito ligados a famíliasão muito unidos e que os filhos são tudo na vida deles. Na segunda parte do vídeo, eles tentam improvisar sobre o tema da ligação familiar, contudo, é evidente que a articulação do discurso é deficiente, apresentando pausas, lentificação na fala, linhas de pensamento prolixas, e a única válvula de escape que eles se apoiam é o retorno ao discurso de frases prontas; "somos ligados a família", "somos unidos", etc.



Palavras

Surpreendentemente, muitos mentirosos são traídos por suas palavras por causa do descuido. São sinais de enganação pelas palavras:
  • Dão mais informações do que solicitadas.
  • Distanciamento na linguagem. É um indício de fraude em que o mentiroso tenta distanciar envolvimento de alguém ou algo a si próprio. Ex: “Eu nunca me relacionei com aquela mulher”; “Eu não me encontrei com a pessoa.”; “Eu não roubei a coisa.” O mentiroso força uma incongruente falta de intimidade e desconhecimento do assunto em questão.
  • Lapsos de fala. O apanhador de mentira deve ser bem cuidadoso, não achando que qualquer lapso de fala é evidência de mentira. Geralmente o contexto em que o lapso de fala ocorre pode ajudar em imaginar se o lapso denuncia ou não uma mentira.

A seguir será tratado o distanciamento na linguagem. Quem não se recorda do escândalo sexual envolvendo o ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton com uma estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky? No início das acusações, Clinton negou, sob juramento, que tinha mantido relações sexuais com Lewinsky. Na entrevista a seguir, Clinton declarou: "Eu não tive relações sexuais com esta mulher, a senhorita Lewinsky".


Posteriormente, com a enxurrada de provas de que ato sexual ocorreu, ele confessou o fato. Nota-se que ele vazou em sua fala um distanciamento na linguagem. Ele implicou um afastamento forçado entre ele e a sua estagiária. Referir a ela como "esta mulher" é uma forma de mostrar pouca familiaridade com a Srta. Lewinsky - pouca familiaridade esta totalmente incongruente com uma funcionária que oficialmente tem contato com ele diariamente. 

O próximo vídeo trata-se de uma com gravação escondida de uma conversa com o goleiro Bruno sobre o caso do desaparecimento de Eliza Samudio. Bruno vaza três distanciamentos forçados na linguagem quando se refere a Eliza. Ele se refere a ela como "essa Eliza", "essa garota", e "a pessoa". Assim como Clinton, Bruno também implica um afastamento forçado entre ele e Eliza. Eles já possuíam um grau de familiaridade muito grande - lembrando que ela, antes de desaparecer, já havia até o denunciado de abuso físico e ameaças para que ela praticasse um aborto. Ou seja, ela não era uma total estranha para ele, por conta disso, sua linguagem ao se referir a ela é totalmente incoerente com o grau de familiaridade dele com ela.


Agora trataremos sobre o lapsos de fala. Como foi dito anteriormente, nem todos lapsos de fala representam vazamentos de verdades escondias, o contexto é um mediador importante na hora de avaliar o valor de um lapso de fala. No exemplo a seguir, veremos novamente um trecho da entrevista com o casal Nardoni, em que o entrevistador põe a seguinte questão para Ana Carolina Jatobá: "Dizem que você tinha muito ciumes dela". Ele estava se referindo a menina Isabella, sua enteada, contudo, Ana Carolina comente um contido lapso de fala ao quase dizer "da Mãe...", se referindo a mãe da Isabella, ex-mulher de seu atual esposo - pessoa que verdadeiramente era alvo de seu ciúmes.


Indícios de fraude no discurso podem ocorrer por duas razões. Um mentiroso pode não ter trabalhado em sua história antes do tempo. Se ele não esperava mentir, ou se ele estava preparado para mentir, mas não antecipou uma pergunta em particular, ele pode hesitar ou cometer um erro no discurso. Alto receio de ser descoberto também pode fazer um mentiroso preparado tropeçar ou esquecer sua linha de raciocínio


Tom de voz

Mentiras podem ser reveladas também pelo som da voz. São sinais dificílimos de esconder. Os tipos de mudanças no tom de voz de acordo com cada emoção:
  • Medo e Raiva: tom alto e grave, ritmo rápido.
  • Tristeza: baixo e agudo, ritmo lento.

Entretanto, é importante evitar riscos:
Receio de ser descoberto = voz de medo = medo de ser descoberto.
Culpa por mentir = voz de tristeza = decepção por estar sendo desacreditado.

Devemos ter cautela ao interpretar uma voz amedrontada como sinal de mentira de um mentiroso com medo de ser descoberto, já que pessoas inocentes também podem soar amedrontadas quando sentem receio de serem desacreditadas.

Na próxima publicação serão tratados os indícios de fraude e os vazamentos que o corpo do mentiroso acaba manifestando - e, com isso, traindo suas mentiras.

Publicação com autoria de: Bruno Maciel

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