Sem dúvida nenhuma, a habilidade de mentir e enganar é uma expressão direta da habilidade social que o ser humano tem. Por mais terrível que isso possa parecer, quanto mais social é uma espécie maior é a capacidade de seus indivíduos de engarem e manipularem uns aos outros em benefício pessoal. O ser humano, com sua infinita complexidade relacional, é o animal mais mentiroso que o bioma já conheceu. Estatisticamente falando uma pessoa normal conta cerca de três mentiras em 10 minutos de conversa.
A mentira parece ter um valor evolutivo importante para o desenvolvimento da nossa espécie devido às vantagens de sobrevivência e reprodução que nossos antepassados obtiveram ao enganar os outros. Em situações atuais, a mentira parece ter uma relevância adaptativa ainda maior, já que habilidades de interação social nunca antes foram tão demandadas no cotidiano. Em contrapartida a essa astúcia de ludibriar, a capacidade de detecção de mentiras foi também selecionada evolutivamente para que os indivíduos da espécie humana sejam capazes de protegerem de trapaças. Muitos pesquisadores consideram que as habilidades de trapacear e de detectar mentiras são uma das razões da expansão da capacidade cerebral dos ancestrais do homem ao longo da evolução e pode ser um dos alicerces evolutivos da arquitetura da mente moderna.
Entretanto, a definição de mentira ainda precisa ser bem analisada. Como podemos definir do que se trata o ato de mentir? Mentir se trata de fornecer uma informação inverídica a alguém? Isso parece um tanto incorreto, pois delirantes, por exemplo, alegam informações falsas, contudo eles realmente acreditam no que dizem. Algumas pessoas relatam situações passadas de forma muito pessoal e, por conta disso, podem cometer erros de fornecer informações inverídicas. Então como consideraremos do que se trata mentir? Mentir está intimamente ligado com a intenção de enganar. Não há mentira sem enganação. Aquele que mente tem intenção de ludibriar alguém. Seguiremos a definição aqui de mentira e engano como quando alguém tem a intenção de enganar outra pessoa, ou seja, faz isso de forma intencional, sem aviso prévio de seus propósitos e sem solicitar explicitamente ao seu alvo.
E quais são as maneiras primárias de mentir? Podemos mentir através da omissão, quando retemos alguma informação sem efetivamente dizer alguma inverdade, e podemos mentir pela falsificação, quando não só retemos uma informação verdadeira como também apresentamos uma falsa informação como se fosse verdade.
Nem todos consideram que omissão seja uma mentira. Alguns reservam essa palavra apenas para atos de falsificação.
Se um médico não conta a um paciente que sua doença é terminal, se um marido não menciona que ele gasta suas horas de trabalho para encontrar com a melhor amiga de sua esposa, nenhuma informação falsa é transmitida, porém, realmente não houve mentiras nesses casos?
Os alvos não pediram para ser enganados; e aqueles que omitiram agiram deliberadamente sem dar um aviso prévio sobre suas intenções de enganar.
Há exceções em que omissão não é uma mentira porque um aviso prévio foi dado ou um consentimento de enganar foi obtido. Ex: Se um casal aceita em ter um relacionamento aberto em que cada um vai omitir seus amantes a menos que um deles seja diretamente questionado, a omissão do encontro no motel com outra pessoa não será uma mentira. Se o paciente pedir ao médico para que ele não anuncie más notícias, a omissão da informação não será uma mentira.
Se estamos dispostos a considerar como detectar vestígios de mentiras sendo cometidas é importante que primeiro tenhamos uma definição clara e exata sobre o que é ou não mentir, para a partir desses pressupostos avaliarmos em seguida os fatores que estão envolvidos nesse processo de enganação e o que podemos analisar para perceber essas trapas.
Referências:
• O novo inconsciente (2011) – Marco Callegaro
• Telling Lies (2009) – Paul Ekman
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